30 de jan. de 2013

A Mágica da Cartola


  Desde a minha infância queria mergulhar nos segredos gelados do oceano e voar pelas nuvens da verdade. Andava pela calçada à noite e o vento penteava o meu cabelo e afagava o meu rosto. As garotas me olhavam na rua, naquele jogo mortal onde a escolhida poderia me levar a uma felicidade eterna ou a um poço de tristeza, conforme o espelho da convivência mostrasse o nosso verdadeiro reflexo. Depois de alguns meses usando as máscaras da idealização, logo elas cairiam e trariam a tona faces cheias de cicatrizes marcadas pela vida. Podíamos ser bonitos por fora, mas estragados por dentro.
   Preferi não me arriscar, cada passo em falso com o amor poderia colocar a vida de muitas pessoas em risco. Fiquei contemplando o meu tabuleiro de xadrez na expectativa de qual seria a minha próxima jogada, ainda havia muitas lições e mistérios sobre a vida que eu não tinha conhecimento. Jogava no escuro, procurando fazer mágica e vencer. Nada de receita de bolo, ouvia sim a experiência que os outros tinham para me passar, mas preferia acreditar nos meus próprios instintos.
   Olhava para os lados, não havia nenhum jogador para me desafiar. Eu continuava manuseando as minhas peças. Quando o meu cavalo negro chegou do outro lado do tabuleiro, o jogo se aproximava do fim. A mulher mais fantástica do mundo surgiu daqueles contos de fada antigo, fiquei admirando toda aquela beleza flutuar pelos sombrios corredores do meu coração, ela preenchia todo aquele buraco negro que eu gostaria de esquecer.
   Fiquei confuso. Não sabia o que fazer. A cada dia eu perdia uma peça, aos poucos eu descobri que o jogo não importava mais, joguei o tabuleiro pelos ares. Coloquei uma aliança dourada como o sol em seu dedo. Pedi-lhe em casamento, desisti de tudo! Andei por um corredor banhado de luz, o padre disse todas aquelas palavras dotadas de esperança e de glória. Como se tivéssemos a certeza de que seríamos felizes durante toda a nossa existência.
   Fizemos amor sem pensar no amanhã. Olhamos as estrelas e dissemos palavras bonitas um ao outro. Estávamos encantados, enfeitiçados. Eu apaixonado por uma pessoa que eu não conhecia que era eu próprio numa versão mais perfeita, e ela apaixonada por tudo. Éramos um só, e não éramos ninguém.
   Num toque de mágica nosso casamento perfeito foi se despedaçando, a cada dia a mágica diminuía. Eu olhava para o tabuleiro espatifado no chão e ficava com um desejo de voltar a jogá-lo. As estrelas não pareciam mais tão encantadoras, nem as juras de amor verdadeiras. Parecia uma piada se os dois tempos distintos fossem colocados no mesmo local.
   Corri para a Igreja, procurando uma luz, um fio de esperança. Lá os anjos riram da minha cara, como se eu fosse quem não sou. E eu realmente não sabia quem era. No final acho que ninguém sabe, fingimos que sabemos. Voltei para casa transtornado. O padre só falava coisas boas, e minha vida no mesmo caos. Foi quando eu vislumbrei o alto do meu armário, minha esposa não estava lá para ver a encantadora cartola mágica reluzir como num filme sobrenatural. E foi nesse momento que eu descobri todas as respostas para o meu mundo rodeado de labirintos. A minha vida precisava de um toque de realidade, só assim as coisas voltariam a prosperar. E se minha esposa não continuasse comigo, o nosso amor não era sincero. A naturalidade das pessoas pode nos levar a um mundo mágico,sem nenhum segredo ou fraqueza para esconder. Agir calculadamente para agradar os outros pode trazer uma linda fantasia que no final não passa de um tenebroso pesadelo!

Um comentário:

Mari disse...

Ficou lindo. Muito, muito bom mesmo! Eu adorei!

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